Livro - Retalhos de uma vida - Lançamento Retalhos de uma vida, conta testemunhos de guerra, sexo e relações interpessoais, analisadas segundo a perspectiva do autor - João António Fernandes - psicanalista Freudiano, que as vivenciou. O autor optou por uma escrita simples, que possa levar a maioria das pessoas a entender a idéia Freudiana. http://www.bookess.com/read/7054-livro-retalhos-de-uma-vida-/ ISBN - 978-85-8045-076-7

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

O mistério das relações

Meus relacionamentos não dão certo, mas não consigo descobrir porquê. Algo estou a repetir sucessivamente sem aperceber-me do que possa ser, e quais suas causas, que me conduzem sempre ao mesmo resultado. Desconheço este movimento interior que me leva à repetição. Depois de algum tempo de colocar a culpa no outro comecei a sentir-me também culpado, nem sei bem porquê, porém, duvidando que as pessoas com quem me relacionei fossem todas iguais, e que eu seria o bonzinho desta história mal sucedida, e as outras só pretendiam um momentos de diversão. Talvez fosse demasiado sério para as pessoas me levarem a sério. Esta intuição, de que a culpa fosse minha, fez-me pedir ajuda, que enquanto não tomei a responsabilidade de algo que não deu certo em minha vida, não a procurei. Deixei de perseguir o causador da minha angústia, o outro, libertei-me desse sentimento de vítima, e finalmente consegui enxergar o sujeito que estava a sujeitar-se à sua própria vitimização. Finalmente a liberdade, pensei eu, quando na realidade ainda não sabia a direção a tomar, embora soubesse o caminho a seguir, o da autonomia e libertação do outro, e de mim mesmo. Mas qual seria o outro de que pretendia libertar-me ? Não. O que fiz, foi dar a liberdade ao outro de ser tal como é, e não como gostaria que fosse, daí que a culpa se tenha virado para mim, como se fosse a interrogação relativamente à minha interioridade, que não conseguia dar uma resposta. A falta do objeto nos faz pensar um pouco assim. Afinal, o que minha interioridade sabia, ou executava, que eu próprio ignorava ? Devo considerar que o sujeito do conhecimento, por vezes, pouco ou nada sabe a seu respeito, do que se passa na interioridade oculta de seu corpo. Este sentir ignorante, e as sucessivas frustrações amorosas, criaram uma ruptura entre um desejo consciente, e algo interior que impedia a sua realização, provocando uma ruptura da energia que ligava ambos os corpos, deixando-me sozinho, entregue a mim mesmo, sem possuir o objeto de desejo. O que fazer com essa liberdade ? Nunca me fora dada a condição de caminhar por mim mesmo, que decerto não saberei, e a insegurança não se fez esperar, e foi talvez por isso, e não por sentir a culpa, que fui em busca de ajuda de alguém que dissesse o que deveria fazer. A insegurança de uma criança que espera a mão da mãe, ou do pai para a conduzir já não estava mais aqui, fora então substituída na pessoa do psicanalista, esperando dele exatamente o mesmo tipo de atitude de meus pais. Abandonado e inseguro resgatei o pai, pensava eu, no poder do psicanalista, que me iria conduzir ao paraíso, como se fosse o histérico a conduzir a dama neurótica por prazeres nunca antes experimentados, eternizando desse modo a criança dentro de mim. Triste e abandonado, deixo-me levar, pensava eu, em que não haveria esforço a fazer da minha parte, e tudo seria resolvido pelo papai, não percebendo que o comodismo é sinônimo da inação, e que por via disso, me mantive sempre de bico aberto à espera do alimento. Desse lugar teimava o psicanalista em não me tirar, como se não quisesse, ou pudesse fazer alguma coisa por mim, dando-me apenas os instrumentos necessários para salvar—me a mim próprio. Como salvar-me da aflição, dos tormentos, se minha alma atormentada, não sabe, nem percebe como fazê-lo ? Esse é o ¨ drama ¨ da análise, tanto para o psicanalista, quanto para o paciente, que deve ser gerido com todo o cuidado, em que não existe mistério, mas exige um saber.

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