Livro - Retalhos de uma vida - Lançamento Retalhos de uma vida, conta testemunhos de guerra, sexo e relações interpessoais, analisadas segundo a perspectiva do autor - João António Fernandes - psicanalista Freudiano, que as vivenciou. O autor optou por uma escrita simples, que possa levar a maioria das pessoas a entender a idéia Freudiana. http://www.bookess.com/read/7054-livro-retalhos-de-uma-vida-/ ISBN - 978-85-8045-076-7

quarta-feira, 2 de março de 2011

Ontologia e transcendência

A ontologia pertence ao campo das experiências, a partir de um movimento endógeno / exógeno, que apresenta como sentido o que está para além do próprio indivíduo, representado por objetos exteriores.
Esta representação é real, como movimento do indivíduo dirigido ás coisas e o mundo, cuja finalidade será a satisfação da sua própria interioridade, entendida como necessidades básicas, que tem na relação física o ponto de encontro do sujeito com o exterior.
A transcendência será sempre aquilo que supera a realidade, que nela não existe, mas que é suposto pelo o indivíduo, que possa existir, em que a imanência será o ato a partir do qual o corpo liberta algo de si, como energia, que viaja no tempo, sem objeto, nem sujeito, como se fosse algo independente.
O fenômeno da transcendência e da imanência pertence ao imaginário, como algo supostamente existente, mas sempre oculto, em que o objeto não existe, e o objetivo será apenas um desejo.
Não podemos encontrar uma resposta científica a partir de uma base espiritual, dado que ela não se sustenta, porquanto estamos a lidar com fantasias, fantasmas, figuras virtuais e fantasmagóricas, que são sentidas no corpo do ser humano, impondo medos, para as quais a mente tende a arranjar uma imagem, como justificação para o que está a sentir.
Este fenômeno talvez nos queira dizer, ao contrário daquilo que é veiculado por algumas pessoas, que a transcendência pode ser na realidade um fenômeno restrito a um plano inferior da evolução do ser humano, que é processado em separado do princípio de racionalidade, e anterior á própria organização mental, no que se refere a conteúdos ideativos.
Explicando melhor; os sentidos não necessitam do pensamento para sentir a relação com as coisas e o mundo, em que o princípio de satisfação é o alvo a atingir de forma natural.
A primeira divergência quanto a esta matéria é proveniente de uma cultura assente na privação, no culto da dor e sofrimento, como forma de atingir a felicidade, que apresenta como finalidade recusar o gozo, e os objetos que possam levar o indivíduo á satisfação, sacrificando o corpo.
A imanência, entendido como ato de libertação de um corpo aprisionado, não pode ter lugar no mundo físico, porque proibido, pelo que a transcendência, que tende a transportar o indivíduo para além de si mesmo, e das coisas terrenas, será um modo encontrado pela mente, para que o indivíduo possa sobreviver á repressão.
A referência a um plano inferior da evolução do ser humano, deve ser entendida como primária, primitiva, como surgimento das primevas imagens, que conduzem o indivíduo á associação de imagens e idéias, cuja finalidade é tornar compreensível, o não compreendido, e que tantas vezes impõe o medo de que algo possa acontecer de ruim.
Nessa primeira etapa da existência de qualquer ser humano nada está determinada para além da genética e da biologia, segundo seus princípios, que são pertença da sua própria condição de ser vivo, que uma vez bloqueado, castrado, é impedido de seguir seu caminho de forma natural, em que o instinto de preservação, desperta a negação, e ao mesmo tempo a procura de formas capazes de sustentar a sua própria vida, e a preservar.
Será então, perante a impossibilidade, que o corpo tende a manifestar-se de forma mais intensa,e m virtude da tentativa de superação perante um obstáculo, que tenta impedir a continuidade de um movimento dirigido, em que nos é dado a observar o poder reativo.
Esta tentativa de superação apresenta como finalidade o afastamento do objeto não desejado, que pode levar até á sua destruição, como forma de abrir caminho para a própria liberdade do ser vivo.
Como podemos perceber, não se trata propriamente de superar a si mesmo, mas antes tentar arranjar mecanismos, que possa conduzir á superação do outro, entendido como obstáculo.
A impossibilidade em prosseguir um caminho, que é da própria natureza do ser vivo, gera uma impotência, que tende a apresentar uma conseqüência reativa, que não ativa, que é capaz de se acomodar, ou procurar uma acomodação, mas que é incapaz de eliminar os instintos de sua própria natureza.
Assim, essa forma reativa, nunca será ativa, em que a existência de ressentimentos emerge, e permanecem, embora possam estar ocultos, como forma reativa proveniente de uma pressão excessiva, designada por repressão, em que o indivíduo se vê obrigado a amar, segundo uma outra condição, ma tentativa de superar a afetação.
Amor e ódio podem ser entendidos segundo a perspectiva de um sentido de afetação, que parece ser o fator diferencial, que pode conduzir o indivíduo á ambivalência emocional.
Parece existir uma sujeição aparente por necessidade, que uma vez não admitida de modo natural, pode levar, por exemplo, uma mulher sujeitar-se a um homem, devido a um desejo psíquico interiorizado, que o dinheiro possa promover o seu bem estar, e que uma vez obtido tal requisito, pode conduzir ao abandono daquele que realizou seus desejos.
A impossibilidade tende a ser geradora da transgressão, não respeitando e considerando o outro nos seus desejos, como também não o foi antes devido a uma formação infantil repressiva.
Contudo, o que nos é dado a perceber é a tentativa de castração, de um bloqueio de movimentos, que não encontrando objeto, nem sujeito, tende seguir seu movimento na tentativa de o encontrar, julgando encontrar-se no além como força poderosa, que o impede de prosseguir seu próprio caminho.
A imanência, entendida como projeção energética, que não é capaz de encontrar o objeto, porque ele não existe, porque proibido, que por isso não pode ser representado, nem representável, uma vez não compreendido, tende a ligar-se a uma imagem imaginária, virtual, como forma de sobreviver á sua própria prisão, castração.
A esse movimento, que provém da imanência, designamos por transcendência.
Se a mente não é capaz de apresentar uma dinâmica psíquica, sem a representação da imagem e seu significado, resultando daí a associação de imagens, que formulará uma síntese, e a conseqüente ação, elas de algum modo são forçadas a existir para que possam ser compreensíveis e determinar a atitude humana.
Em resumo, num plano inferior, ou primário da existência do ser humano, a existência de imagens é fundamental, e sem elas não pode haver o simbólico, nem pensamento, e como lhe foi dado pela própria natureza a capacidade de pensar, o indivíduo é forçado a fazê-lo, por ser essa uma condição do seu próprio organismo.
Como, e por intermédio de que mecanismos pode obter as imagens, para que possa conseguir organizar o pensamento em face daquilo que lhe é dado a observar, pertence a um plano de busca, que ao não ser encontrado o objeto nas coisas terrenas, o procura no além.
Não se trata, a meu ver, de algo inusitado, que não possa ser percebido como característica humana, dado que o recurso a imagens virtuais é próprio, de quem é impedido de viver a realidade através das relações entre humanos de forma natural.
O plano de transcendência nada tem a vercom a superação de dificuldades, apenas sendo uma conseqüência, e muito menos terá alguma relação com imagens reais observadas, que o indivíduo tende a fantasiar, em que estas pertencem ao mundo físico, e aquelas a um mundo inexistente.
Existe por isso, a necessidade de existir algo semelhante no além, ou mais além, que nos possa oferecer aquilo, que os humanos tendem a roubar ao outro, o poder interior.
A resultante será a demonstração de um poder que não existe de fato, que emerge de um sentido de impotência, que baqueia perante a agressividade alheia, e pode conduzir á destruição, ou á imobilização, por interiorizar a sua própria impotência.
Desse modo, podemos perceber que a atitude reativa é sempre proveniente de um falso poder, dado que apresenta poucas condições de afirmar-se por si mesmo, e somente tende a fazê-lo quando na presença, e no combate a um outro indivíduo.
Para o cérebro não existem diferenças, quer se trate de formas ontológicas, ou transcendentais, em que aquela é sustentada por um objeto, e esta não o será em princípio, mas á qual é associada uma imagem, cujos significados já existem, para que possa ser organizada do mesmo modo.
Nos é dado a observar a construção de imagens virtuais, imaginárias e fantasmagóricas, dada a ausência de uma representação individual, porque proibida, pelo que se vê obrigado a representá-las noutro lugar, que pouca importa se existe de fato, ou não, dado que a função assim o exige.
A existência de um fluxo energético produzido por um corpo carece de ligações a objetos, pelo que as relações, e sobretudo a forma como são sentidas pelo o receptor, considerado passivo, e por conseguinte induzido, tende a influenciar o modo como vai, e pode ser organizado tais fluxos no organismo do ser vivo.
Talvez não nos custe entender, que a vida, por isso, será um constante fluxo de energias, que necessitam de serem organizadas segundo uma condição genética / biológica, em que o pensamento não se torna fundamental.
A impossibilidade, provocada pelo o bloqueio de energias dirigidas, tende a formar um ser impossível, que por impossibilidade não se torna naquilo que é, que se tornará em outra coisa qualquer, que pode causar dissabores a todos aqueles, que estiverem por perto, e a si mesmo
Desse modo, podemos deduzir que as imagens produzidas por uma necessidade de transcendência, são imagens impossíveis, que não são provenientes de uma imagem real, cuja finalidade parece ser a sustentação de uma possibilidade proibida, que alguns homens tentam tornar impossível.
Podemos perceber quanto inglória será essa determinação psíquica.

Referência bibliográfica :
- Texto de Luís Carmelo – Universidade Autónoma de Lisboa ( Portugal )
- Signo, tempo e consciência; Gilles Deleuze e António Damásio

Para António Damásio a intencionalidade provém da capacidade do cérebro em contar histórias.
Essa capacidade precede a linguagem, o que é até, afinal, uma condição para a (própria) linguagem.

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